sexta-feira, maio 05, 2006

Dois jovens no Buraco


Este é o segundo cartoon que Bruno Taveira introduz no Buraco da Fechadura (quiçá os primeiros cartoons que desenhou!...).
Como já aqui foi revelado, o Bruno ér natural de Vila Real e estuda em Mirandela.

O cartoon abaixo, acaba de nos chegar de Rui Santos, de Freamunde. Faz marte de um grupo de três que nos mandou, mas os outros dois ficam para mostrar daqui um dia ou dois.

A Joana Campante, uma excelente caricaturista que nasceu "acidentalmente" em Lisboa em 1968 e veio de seguida para Leiria onde fez os estudos da Primária e da Secundária (e até um curso de canteira no Mosteiro da Batalha!) tendo-se licenciado posteriormente em Lisboa onde agora é professora, dizia-me um dia: "A minha geração praticamente não forneceu cartoonistas! Só forneceu caricaturistas!". Apontou-me as raríssimas excepções e desafiou-me a apontar-lhe mais. Mas, realmente, não havia. E, de aí para cá, embora o panorama tenha melhorado algo com as gerações seguintes, não trouxe muita gente nova para a actividade.

Eis por que deveremos (parece-me...) rejubilar de cada vez que aparece mais um cultor do Humor Gráfico. E, de uma assentada, o Buraco da Fechadura revela dois.

Mas, acreditando que estes dois jovens tenham capacidade de encaixe para "apanharem na cabeça", (coisa que hoje em dia muitos não têm...) vamos tecer aqui algumas considerações que espero interpretem como construtivas!

À atenção do Bruno Taveira

Bruno, há um pormenor que desejo realçar: foi ontem que uma das televisões mostrou, no seu telejornal, uma reportagem que demonstrava quanto era escasso (quanto era ilegal, até) o tempo que os semáforos dedicam aos peões em certas passadeiras de Lisboa. E... foi ontem mesmo que aqui entrou pelo Buraco este teu cartoon! (Não o publiquei ontem mesmo, por limitações de saúde).
Esta rapidez de ataque ao problema, é de verdadeiro cartoonista! Isto foi o que mais me agradou.
Porém, como já me deste provas de que és um indivíduo inteligente, arrisco a fazer algumas considerações que te possibilitem melhorar o teu já demonstrado talento para esta arte. Vejamos: Tiveste a feliz ideia de "subverter" a realidade, imaginando uma dura prova em que participam dois atletas que se aprestam a partir para o "contra-relógio". Mas - tenho de te dizer - os cidadãos não estão na pose de quem aguarda pelo "disparo da pistola"! Falta-lhes atitude. Sabes? Frequentemente, um cartoonista dedica mais tempo a pesquisar acerca de um ou mais elementos que o seu cartoon vai conter, do que propriamente à sua elaboração final. Se pretendes desenhar, por exemplo, dois "executivos" prontos para atravessar uma passadeira em corrida de maratona, necessitas de saber como é que se desenha um "executivo" e... como é que se desenha um atleta em posição de arranque. Onde podes obter essa informação? Visitando uma pista de atletismo durante o treino e fazendo os teus esboços (ou as tuas fotos), consultando revistas ou jornais de desporto, pesquisando na internet, etc etc. E procedendo de igual modo em relação a executivos (procurando-os noutras "pistas de competição", embora um ou outro, como o Sócrates, "acumulem").
E toma em atenção as regras básicas do desenho, como é o caso da perspectiva. O desenho de caricatura não é o desenho da balda. Longe disso!
E não te esqueças de que os balões são para serem lidos. E, nesta tarefa, alguém te merece mais respeito do que o leitor? Claro que não. Portanto, desde que não haja uma justificação clara (que até pode ser apenas de ordem estética) não deves escrever o lettring inclinado. Deves escrever horizontalmente. Cada letra deve ser desenhada com o mesmo empenhamento com que desenhas um objecto, não deves escrever com a caligrafia que usas para preencher o totobola. E deves ter em atenção o tamanho de publicação que imaginas que o desenho vai ter, de modo que o leitor não tenha de ir para o oftalmologista de cada vez que contemple um cartoon dos teus.

À atenção do Rui Santos

Muito do que disse ao Bruno, serve perfeitamente para o Rui Santos, de Freamunde.
Não te lamentes por teres falta de ferramentas para desenhar no computador. Porque me parece que não é bom caminho iniciar a aprendizagem do desenho noutro sítio que não seja uma folha de papel! Ninguém aprende a conduzir automóveis sem primeiro ter aprendido a "conduzir" sapatos (ou ténis, se preferires). E afinal, tu até desenhas sobre papel. O lamento da tua mensagem referia-se certamente ao facto de teres de meter as legendas em Word. Mas deixa que te diga que o Martin Favelis (um argentino que vive em Granada, Sul de Espanha) tornou-se famoso pelo seu excelente humor com animais que ele desenha apenas com o rato e... no word! Faz uma pesquiza através do Google (ou mesmo no Buraco da Fechadura, pelo menos na fase do Buraco no Sapo).

Se me permites, não te aconselho o caminho do "desenho fácil", estilo dois rostos e dois balões. Quem já tem um longo percurso na matéria, pode dar-se a "esses luxos" de síntese, porque já possui um back ground que lhe evita repetir-se. E, se vires um cartoonista a repetir o mesmo desenho em dois quadros seguidos, não lhe sigas os passos. É um caminho muito pessoal para um ou outro e, além disso, é uma solução do presente/passado, não do presente/futuro.

Um balão com lettring desenhado é sempre uma mais-valia para o cartoon. Um acrescento mecânico do lettring é sempre uma menos-valia. Por minha parte, só uso quando estou muito apertado com falta de tempo.

Inventa soluções para cartoons. Nunca uses ideias alheias. Mesmo que sejam anónimas. Se´procurares, talvez encontres por aí um ou outro cartoonista que por vezes plagia ideias alheias. Mas olha que pode até nem ser plágio, pode ser simples coincidência.

Para terminar: A força do cartoon é a sua grande comunicabilidade. O público "aggarra" muito bem os cartoons. Então, não devemos gastar energias a fazer humor do género "Cristo era carpinteiro porque pregava muito". Sem questionar a originalidade do humor, tenho de arranjar coragem para te dizer que essa não é uma piada de cartoon, é uma anedota de café. São coisas muito diferentes. Podes pegar no Cristo e fazer um cartoon (há 500 anos não poderias...), não é isso que está em causa, mas se o fizeres, que seja por uma causa.

Um cartoon é uma manifestação de opinião. Que até nem tem de ter necessariamente humor...

Mandem mais desenhos!
Zé Oliveira

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